Em conversa com Sílvia Mota, autora do Livro “Alice, uma Abelha Diferente.”

A inclusão é um tema muito importante, que deve ser explicado logo bem cedo. E a Alice vem-nos relembrar através da sua bonita estória.

Olá! Antes de mais, muito obrigado por aceitar esta entrevista. Pode começar por nos contar um pouco sobre si e o que a inspirou a escrever “Alice, uma abelha diferente”?

Olá! Em primeiro lugar, muito obrigada pelo convite, fico muito honrada pela oportunidade.

Chamo-me Sílvia Mota, sou casada e mãe do Gonçalo que tem 16 anos; sou professora do 1.º ciclo e sou, também, escritora. Gosto muito de escrever e contar histórias para crianças, mas também gosto de escrever contos e poesia para adultos.

A história da abelha Alice tem muitos anos (mais de vinte!). Quando escrevi esta história, estava a trabalhar com uma turma do 1.º ano e, nessa altura, não havia grande variedade de histórias para iniciar as letras, nem os manuais eram apelativos e senti necessidade de criar histórias para cada uma das letras de forma que a aprendizagem fosse mais divertida e significativa. Inicialmente, a história da abelha Alice era muito simples e foi escrita para introdução da vogal “a”. Entretanto, esta e outras histórias ficaram guardadas durante algum tempo. Um dia, resolvi reescrever a história da abelha Alice e dar-lhe um novo propósito. A Alice nasceu com as asas azuis, era uma abelha marcada pela diferença e achei que podia ser uma grande ajuda para as crianças que, também, de alguma forma, se sentiam diferentes. É na escola que as crianças convivem em grupo e se deparam com as diferenças e individualidade de cada um. Esta convivência nem sempre é vivida de forma empática e pacífica. Li a história aos meus alunos (de um novo grupo) e adoraram! Foram eles que deram o nome à história “Alice, uma abelha diferente”. Entretanto, perdi todo o conteúdo do meu disco externo, onde também se encontravam as histórias. Fiquei muito triste, como pode imaginar! Há cerca de 4 anos, um colega que trabalhava comigo, o Luís Oliveira, contactou-me para solicitar autorização para trabalhar a história no Dia da Abelha, que se celebra a 20 de maio. Foi uma grande surpresa, porque não me lembrava que, na altura, lhe tinha enviado a história por email. Guardei (muito bem) a Alice até ser enviada à Editora Trinta Por Uma Linha. Estes acontecimentos fazem-me acreditar que a Alice tinha mesmo de ser editada!

O livro aborda temas de inclusão e aceitação das diferenças. Por que escolheu uma abelha como protagonista para transmitir esta mensagem?

Como referi na questão anterior, inicialmente a abelha Alice surgiu para ajudar na introdução da letra “a”, por este motivo, ao longo da narrativa podemos encontrar várias palavras iniciadas por esta vogal. Quando voltei a pegar na história para lhe dar outro propósito, apercebi-me que não podia ter personagem mais adequado para a escrita do conteúdo. Confesso que sou fascinada por estes seres maravilhosos! As abelhas simbolizam uma série de valores e lições que se adequam profundamente com o conceito de inclusão. São conhecidas pela sua organização social e por trabalharem em conjunto para o bem-estar da colmeia. Cada uma tem um papel específico e dependem umas das outras para sobreviver; cada abelha trabalha para um todo, cada uma tem algo a acrescentar independente das suas qualidades ou diferenças, o importante é que o resultado seja benéfico para toda a colmeia. Em sociedade, deveríamos seguir o exemplo destes seres de enorme inteligência e aprender a aceitar e a respeitar cada indivíduo nas suas diferenças.  As abelhas ensinam-nos que a inclusão é essencial para uma sociedade saudável e harmoniosa, onde cada indivíduo tem um papel importante a desempenhar.

Como é que a história de Alice pode ajudar as crianças a compreender e aceitar as diferenças entre elas?

A Alice é uma abelha que nasce com as asas azuis, uma condição, até ao momento, única e especial. Ao se identificarem com a Alice, as crianças que, por alguma razão, se sentem diferentes dos seus pares podem ver a sua própria experiência refletida na história. Isso ajuda-as a entender que ser diferente é normal e pode ser uma força, não uma fraqueza.

No início da história, as outras abelhas não entendem a Alice e tratam-na de forma diferente, porque, no fundo, assustam-se com algo que desconhecem e acabam por ter atitudes de grande frieza. As crianças ao perceberem que a Alice, mesmo nos momentos de fragilidade, enfrenta e supera esse preconceito, podem ser levadas a refletir e a aprender sobre os desafios que estão relacionados com a diferença e a importância de tratar todos com respeito e compreensão. Esta tomada de consciência pode despertar mais empatia para com o outro, crucial para a vida harmoniosa em sociedade. A abelha Alice pode incentivar as crianças a serem mais inclusivas nas suas próprias amizades.

A inclusão é um tema muito importante na sociedade atual. Que mensagem principal gostaria que os leitores, especialmente as crianças, retirassem do seu livro?

Incluir é abraçar a beleza das diferenças” é a mensagem que se encontra na sacola (tote bag) que faz parte da promoção do livro. Esta é, sem dúvida, a grande mensagem desta história. Ser diferente é especial, e as nossas diferenças tornam-nos únicos e importantes para a comunidade.

Quando aceitamos e valorizamos as características que nos fazem únicos, contribuímos para um mundo mais rico, diverso e inclusivo.

O seu livro também toca em questões de saúde mental e bem-estar, especialmente no que diz respeito à aceitação de si mesmo. Pode falar um pouco sobre isso?

A história da Alice pode servir como ponto de partida para discussões em casa ou na escola sobre aceitação e inclusão. Estes diálogos podem ajudar as crianças a expressar os seus sentimentos sobre as suas próprias diferenças e sobre como veem os outros, promovendo uma mentalidade mais aberta e saudável.

As crianças que se sentem diferentes, muitas vezes, enfrentam ansiedade social, temendo o julgamento ou a rejeição. A Alice, também enfrentou desafios e dúvidas sobre si mesma ao longo da história, mas ao ver como ela supera esses obstáculos, as crianças aprendem sobre resiliência. A Alice, ao aprender a valorizar as suas diferenças, mostra às crianças que não há problema nenhum em se ser diferente. Isso pode ajudá-las a aceitarem as suas próprias características únicas, seja em termos de aparência, habilidades, personalidade, estatuto social ou cultural. Na história, a Alice não altera a sua característica especial, as asas azuis, isso é muito poderoso, porque reforça a ideia de que não é necessário “modificarmo-nos” para sermos aceites na sociedade, encorajando as crianças a ter uma autoimagem positiva.

Ao perceberem que a Alice é integrada e valorizada por quem ela é, as crianças podem aprender que é possível ser aceite, mesmo quando se sentem “fora do padrão”, aliviando a pressão que sentem para se encaixar e ajudá-las a se sentirem mais confortáveis. Isso é fundamental para a saúde mental, pois ajuda-as a lidarem com desafios e a tornarem-se mais confiantes.

A Alice, sendo a personagem principal, serve como um modelo positivo de alguém que aprende a amar-se e a ser confiante na sua própria condição. As crianças podem interiorizar esta lição e aplicá-la nas suas próprias vidas.

Como vê o papel dos profissionais de saúde na promoção da inclusão e aceitação das diferenças nas crianças?

Os profissionais de saúde têm uma posição privilegiada na promoção positiva do desenvolvimento emocional, social e mental das crianças, atuando como defensores da diversidade e da inclusão.

Estes profissionais podem identificar precocemente problemas de saúde mental ou dificuldades de aceitação que as crianças possam enfrentar devido a diferenças percebidas, como deficiências, transtornos de aprendizagem, à integração social e cultural ou questões relacionadas à identidade. Ao identificar estes problemas, podem intervir com estratégias de apoio e terapias que promovam a aceitação de si e dos outros. É importante que estes profissionais trabalhem em parceria com as famílias e, também, com as escolas.

A promoção de workshops, formação para pais e professores podem ser estratégias eficientes no esclarecimento de sinais de alerta ou na compreensão de estratégias a serem desenvolvidas em caso de suspeita de que a criança possa sentir que não está a ser incluída ou não se sinta incluída.

As dores emocionais não são tão facilmente detetáveis como as dores físicas, é preciso uma atenção redobrada e devem ser tratadas com cuidado, delicadeza e responsabilidade. A saúde mental é fundamental para o crescimento saudável de qualquer criança e todos somos responsáveis por esse bem-estar.

Pode partilhar connosco alguma reação ou feedback que tenha recebido de leitores ou pais que leram o livro com os seus filhos?

Os adultos apreciam a abordagem sensível e positiva ao tema da diversidade, a mensagem de que todos têm valor, independentemente das diferenças, é muito elogiada por pais e educadores. A linguagem acessível e a narrativa simples tornam o livro adequado para leitores mais novos; as ilustrações, coloridas e atraentes, trabalho espetacular do ilustrador Paulo Salvador Lopes, ajudam a captar a atenção das crianças e a transmitir a mensagem de maneira visualmente envolvente. As crianças adoram a Alice, têm uma ternura especial pela personagem, identificam-se e sentem-se inspiradas pela sua coragem e capacidade de ultrapassar as dificuldades.

Tem sido muito gratificante receber este retorno por parte dos leitores.  

Além de “Alice, uma abelha diferente”, tem outros projetos ou livros em mente que também abordem temas sociais importantes?

O meu livro infantojuvenil “Em busca da Joaninha Dourada”, publicado pela Chiado Editora, aborda o tema do cuidado, respeito e preservação da natureza e alerta para as alterações climáticas. No período em que vivi em São Tomé e Príncipe, escrevi um conto que aborda a problemática da gravidez precoce e, recentemente, escrevi um conto para adultos, cujo tema principal é a Doença de Alzheimer. Espero vir a publicá-los brevemente.

Como vê o papel da literatura infantil na promoção de valores como a inclusão, a diversidade e a saúde mental?

Abordar temas sociais em livros infantis é uma tarefa significativa e pode ter um impacto duradouro na formação das crianças. Ao apresentar personagens e histórias que refletem diferentes culturas, contextos e emoções, ajuda as crianças a desenvolver empatia, aceitação e a compreensão das diferenças, além de abordar temas importantes, como a superação de desafios emocionais, contribuindo para o desenvolvimento de uma autoimagem saudável e da resiliência emocional desde cedo.

Que conselhos daria a outros escritores que desejam abordar temas sociais importantes nos seus livros infantis?

Para quem deseja explorar estes temas é importante não esquecer o respeito pela inteligência da criança, não subestimar a capacidade que as crianças têm de entender questões complexas, usando uma linguagem cativante, com uma estrutura concisa, sem perder a profundidade do tema; criar personagens com as quais as crianças se possam identificar, que enfrentam desafios, mas também encontram soluções positivas; ter o cuidado de selecionar ilustrações apelativas que complementem e fortaleçam a narrativa; abordar os temas com honestidade e evitar banalizações, as crianças são sensíveis e muito críticas. É fundamental que se aborde estes temas de forma respeitosa.

Por fim, onde é que os nossos leitores podem adquirir o seu livro e seguir o seu trabalho?

O livro está a venda nas livrarias online, como por exemplo, Trinta por uma Linha, Wook ou Bertrand. Mas podem seguir o meu trabalho no Facebook ou Instagram.

Obrigada Sílvia pelo seu magnífico trabalho e ficamos a aguardar novidades.

Eu é que agradeço à Salus Magazine, à Ideias Únicas – Produção de Merchandising, a todos os pais dos meus alunos e aos meus alunos, todo o apoio na concretização deste projeto e por ajudarem a materializar o sonho da edição do livro “Alice, uma abelha diferente”. O apoio aos novos escritores é fundamental para que mensagens tão impactantes como a da abelha Alice possam chegar às crianças.