Ninguém faz Greve porque Quer!
Artigo de opinião de Joana Russo, Farmacêutica Hospitalar.

Ninguém faz greve porque quer. Faz-se greve porque a pessoa ou entidade com quem estamos a tentar negociar está de costas voltadas e de ouvidos tapados.
Quando decidi ser Farmacêutica Hospitalar queria trabalhar para os doentes, queria contribuir para a sociedade. Ao mesmo tempo, sabia que do ponto de vista do conhecimento e da actualização contínua, ia ser exigido muito de mim, e isso agradava-me. Pouco sabia de carreiras.
O que fiquei a saber sobre carreiras, ao fim de 15 anos de trabalho, é simples: não existe progressão na carreira, não abrem concursos e nem sequer interessa se a pessoa atingiu todos os objectivos que lhe foram propostos, porque no final do biénio é confrontada com o facto de apenas uma percentagem de funcionários poder ser “relevante”…e então? E então têm de baixar as notas dos outros. Boa sorte para conseguirem os pontos para progredir.
O que também fiquei a saber é que a nossa tabela remuneratória não é revista há 24 anos, enquanto outras, e bem, o foram. Que impacto tem isso na prática? Na prática existem quadros superiores que entram para o Estado com Licenciatura, a receber mais do que outros que entram com um Mestrado Integrado como é o caso dos Farmacêuticos.
Qualquer um vê que o sistema está de pernas para o ar, digo eu. Seria mais ou menos fácil de perceber a injustiça, mas não. Na altura em que escrevo isto o Ministério da Saúde recusa-se sequer a ter uma reunião com o Sindicato Nacional dos Farmacêuticos.
E porquê? Não sei, provavelmente porque somos poucos, ou porque o nosso trabalho passa sem ser visto de fora, mas os Farmacêuticos estão nos Hospitais e são essenciais para o tratamento dos doentes.
Existem muitas outras injustiças, tantas que parecem ficção. Como o facto de pessoas com 20 anos de trabalho não serem aceites em concurso porque, à data do concurso, a carreira só tinha sido criada há 5 anos. Então, como só tinham transitado há 5 anos, considera-se que só tinham começado a trabalhar nessa altura. E outras situações. Tantas, que não as consigo colocar aqui todas. Tantas, que nos levam a fazer greve, a fazer manifestações, a fazer petições.
Ainda assim, todos os dias dou o meu melhor. Todos os dias visto a bata branca e atendo os doentes com a maior empatia e profissionalismo possível. E todos os anos vejo colegas meus a abandonarem o SNS. A pesarem a pressão e a responsabilidade que têm, contra o reconhecimento e condições de trabalho que lhes são dadas, e a decidir que não compensa.
Também eu já pensei em bater com a porta, mas no fim do dia continuo a sentir que embora o Governo não o faça, o meu trabalho é reconhecido pelos doentes e pelos profissionais com quem colaboro, e isso tem-me sido suficiente.
Com as condições oferecidas, os recursos humanos são insuficientes. O que não é surpresa nenhuma. Com recursos insuficientes, a segurança dos tratamentos pode ser comprometida, e eu não quero isso.
Sei que as greves têm impacto nos doentes, e num mundo ideal não teriam, mas ninguém faz greve porque quer. Faz-se greve porque o diálogo não é possível.
Ajude-nos e assine a petição.